Joan Margarit, arquitecto, professor universitário e poeta catalão premiado, esteve recentemente em Portugal, tendo dado uma entrevista a José Fialho Gouveia no programa Bairro Alto, da RTP 2, que se pode ver aqui.
Nessa entrevista aborda, entre outros aspectos, a necessidade de, nas actuais democracias, se reequacionar a educação, para que as pessoas possam ir além do trivial e, nessa medida, apreciar o que, afinal, vale a pena.
"- O mais baixo da humanidade é uma pessoa que, apoiando-se nas armas, substitui a cultura, a liberdade pela opressão e pela ignorância. É o que humanidade pode fazer de mais baixo (…). Muitas vezes há críticas à democracia… A democracia tem muitas dificuldades, evidentemente (...). Um dos grandes erros da nossa geração, nos anos sessenta, foi pensarmos que, com a barriga cheia, quando as pessoas estivessem bem alimentadas, quando o pão chegasse para todos, depois da substituição da ditadura, ler Shakespeare era imediato. Era o passo seguinte, automático. E não é automático. Se há um passo fácil, é o de dar de comer porque nisso influem as máquinas, a organização… A ciência pode dar de comer, mas, depois de estarem alimentadas, as pessoas não vão ler Shakespeare. As pessoas vão é ao futebol. Nós pensávamos que isso tinha acabado com o Franco, e não acabou. Agora temos uma sociedade alimentada que não se molha à chuva, mas que não lê Shakespeare. Esse passo é muito mais difícil. Porquê? Porque podemos dar de comer a milhões de uma vez, mas não podemos pôr milhões a ler de uma vez. A leitura é um acto solitário.
- Mas achas que a democracia falhou na educação?
- Não. Não falhou, só que é muito mais difícil, e nós não sabíamos. Por isso é mais difícil saber que a poesia é um refúgio. Quantas pessoas sabem que a poesia é um refúgio? Quantas pessoas estão dispostas a fazer um esforço para ler um poema? Qualquer um pode ler um poema. Quem sabe ler um jornal pode ler um poema, mas não com o mesmo esforço com que se lê o jornal, porque aqui também não se oferece nada. Se as coisas são boas, é preciso alcançá-las, portanto é preciso um pequeno esforço."
Helena Damião
Consultora do CFIAP
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