A partir dos anos de 1970, a investigação do ensino começou a dar atenção especial à pessoa que o professor é, e ao contexto escolar em que ele está integrado. Isto para melhor se perceber o seu trabalho.
De entre as diversas linhas de estudo que se organizaram, uma das mais produtivas é a que se tem dedicado ao mal/bem-estar na profissão, sendo que a maior parte dos trabalhos publicados incidem no primeiro aspecto.
Em Portugal, nesta matéria, têm-se por incontornáveis os trabalhos de José Esteve, professor da Universidade de Málaga, onde se esclarece que o mal-estar docente é um conjunto de reacções dos professores à mudança social, as quais se traduzem no sentimento de desajustamento em relação à profissão e na impotência para a exercer de modo correcto.
As pesquisas de carácter empírico que realizou permitiram-lhe apurar dois grupos de factores que contribuem para a formação de tais reacções:
- factores de primeira ordem “que incidem directamente sobre a acção do professor na sala de aula, modificando as condições em que desempenha o seu trabalho” e
- factores de segunda ordem que se referem “às condições ambientais, ao contexto em se exerce a docência” e sobre os quais o professor não tem controlo directo.
Além disso, identificou várias fontes de mal estar:
1) aumento das exigências sobretudo devido ao desempenho de novas tarefas que não são acompanhadas pela formação adequada;
2) inibição educativa de outros agentes de socialização. Por exemplo, ensinar certas atitudes, que tradicionalmente eram da competência da família;
3) desenvolvimento de fontes de informação alternativas à escola, o que implica uma revisão do papel do professor;
4) ruptura do consenso social sobre o que deve ser a educação escolar: de um certo acordo tradicional passou-se para uma pluralidade de opiniões;
5) aumento das contradições no exercício da docência: o professor desempenha papéis que não são de fácil conciliação, por exemplo, prestar apoio afectivo e classificar;
6) mudanças de expectativas em relação ao sistema educativo: de um ensino de elite, baseado na selecção e competência passou-se para um ensino de massas mais incapaz de assegurar um trabalho adequado dos alunos;
7) modificação do apoio da sociedade ao sistema educativo: parece existir a ideia de que os professores são os únicos culpados do funcionamento escolar;
8) menor valorização social do professor, sendo o aspecto económico um revelador desta situação;
9) mudança dos conteúdos curriculares, devido ao extraordinário avanço das ciências e à transformação das exigências sociais;
10) escassez de recursos materiais e deficientes condições de trabalho;
11) mudança das relações professor-aluno: o grande número de alunos, as características particulares de alguns, a falta de autoridade do professor são exemplos de aspectos que contribuem para tal;
12) fragmentação do trabalho, dado que o professor é chamado a desempenhar múltiplas funções o que além de provocar dispersão é impeditivo de um desempenho adequado.
12) fragmentação do trabalho, dado que o professor é chamado a desempenhar múltiplas funções o que além de provocar dispersão é impeditivo de um desempenho adequado.
Batem certos, portanto, os resultados da investigação de Esteve com a espontaneidade patente no texto Querem que eu dê aulas!?
Referências:
ESTEVE, J. (1991). Mudanças sociais e função docente. A. NÓVOA (dir.) (1991). Profissão professor. Porto: Porto Editora, 93 e seg.
ESTEVE, J. (1992). O mal estar docente. Lisboa: Escher.
Helena Damião
(Consultora do CFIAP)
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